sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Revisitação: Post(al) de Outono

(Daqui)
Às 10 da manhã da passada segunda-feira estavam 5 graus em Riaño. O ar frio e sem vento vaporizava-se sobre as águas paradas da barragem, que pareciam ferver. E uma nuvem ondulante colava-se às cumeadas rochosas da cordilheira cantábrica. Era tão belo que quase fiquei deprimido por não ser possível apanhar aquilo tudo com uma simples câmara fotográfica.


Ali, na antecâmara dos Picos de Europa, eu contemplava uma Espanha silenciosa e fria, um mundo distante de tudo, parado numa indiferença milenar e na sua majestade natural. Uma Espanha que não era a minha.
Não, a minha Espanha não era esta. A minha Espanha era a do Sul, com todos os seus clichés – sol, calles abrasadas, pó e charnecas desoladas, tapas, flamencos e pasodobles. Uma Espanha inicialmente imaginada na meninice através de visitas ao Ribatejo aqui ao pé da porta – uma Espanha que cheirava a cavalos e a azeite, com cartazes de touros, pátios mouriscos e uma língua que pouco mais era do que um português apalhaçado. Lisboeta de pai e mãe, a minha Espanha não é a de Vigo ou a Coruña, mas a de Badajoz ou Sevilha.
Até hoje, em cada ida a Espanha eu não consigo evitar compará-la com essa imagem inicial, e acho que nunca deixarei de o fazer. Ainda hoje, e mesmo muito depois de ter descoberto as sonoridades viscerais de Garcia Lorca, ou a força e a beleza plástica de que a língua espanhola é capaz, até numa simples crónica de jornal, eu contraponho ao que oiço ou leio essa caricatura de português que me soava na infância ainda povoada de Joselitos, Marisóis, palhaços de circo, pesetas fracas, caramelos baratos e imagens de gente de alpercatas trazendo as cicatrizes de uma vaga guerra civil travada numa terra cruel onde se matavam touros na arena.


Não, a minha Espanha não era esta das paragens quase alpinas, das gentes de fala sóbria e sotaque austero – esta España húmeda de que falava Ortega y Gasset quando, através dos penhascos cantábricos, passava como eu das planuras castelhanas para as matas e pastos verdes da costa asturiana, envolta em brumas atlânticas, de que se diz ter por fronteira norte “a Inglaterra, com o mar de permeio.” A verdade é que lá também dizem que “a Espanha é isto, e tudo o resto não passa de território conquistado aos mouros.”

É no fundo por esta não ser a minha Espanha que eu amo a Espanha e gosto dos espanhóis. Porque gostam da vida e de ser o que são, e pelo país que têm, onde há de tudo. E porque, como se vê pelas citações, também têm complexos mais ou menos velados – de inferioridade em relação ao Norte, de superioridade em relação ao Sul. Esse país a que, apesar de tudo, me orgulho de não pertencer, também é um pouco meu, e de todos nós aqui neste canto. Parafraseando Jean-Marie Le Pen de forma benigna, j'aime bien les espagnols, surtout chez eux.

3 comentários:

  1. Olá

    Que capelinha é esta? Onde se localiza? Eu penso que sei, mas... Poderá dizer-me?
    Rui

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  2. Fica na costa das Astúrias, a oeste de Avilés, por alturas de Cadavedo e não longe da praia do Silêncio.

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  3. Olá

    Obrigado pela informação.
    Quando vi a fotografia pensei que pudesse ser de uma capelinha perto de Juromenha junto ao rio Guadiana, localizada perto da ponte destruída que ligava Portugal a Olivença. Agora estou curioso de confrontar as duas capelas!... Serão muito parecidas ou... serão muito diferentes...

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