quinta-feira, 13 de agosto de 2009

La lhéngua de l Mirandum


Durante muito tempo foram terras que ficavam lá para trás do sol-posto, cus-de-judas, fins do mundo. Isso ajudava ao fascínio desses lugares lá na esquina nordeste deste rectângulo que nos calhou em pátria. Eu sempre o tive, pelo menos.
Esta semana fui bater lá na esquina, que já não é tão longe como isso. Ainda retém tintas de mistério, ecos do fundo dos tempos trazidos nas fragas do rio que escava o planalto, nas pedras das casas, no som das gaitas e bombos, nessa lhéngua mirandesa que lá foi ficando e ainda se vai falando, apesar de tudo - e que mostra como também em Portugal não há só uma maneira de dizer as coisas. Aqui está ela.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

O dois da escarpa

Em Miranda do Douro, na fraga que cai sobre o rio, fronteira à cidade, existe uma zona a que chamam "escarpa amarela," pela cor que lhe dão musgos e líquenes. Com alguma atenção, pode ver-se o algarismo 2 desenhado na rocha.
A curiosidade está em que é um fenómeno puramente natural. De resto, nenhuma mão humana teria conseguido produzir aquilo, dado que aquele ponto é de muito difícil acesso, senão impossível. E, francamente: quem se daria ao trabalho e aos perigos de escalar ou descer tão medonha fraga para lá colocar um mísero 2, que não quer dizer coisa nenhuma? Ainda se fosse um 3 ou um 7, números mágicos, ou um "Amo-te Tatiana," a coisa valeria a pena. Mas um 2, essa balofa simetria, esse nem ata nem desata? Ninguém arriscaria o esqueleto por tal coisa.
É pena que a própria Natureza tenha demonstrado imaginação tão banal, e tão prosaica. Essa Natureza que já fez ver aos homens a face de Cristo ou da Virgem em lugares tão improváveis como túneis de metro e tostas mistas, podia ter feito um jeitinho ao município mirandês.
E daí, se calhar foi sábia, a natureza. Ao escolher um símbolo tão neutro como o 2, limitou-se a mostrar as suas habilidades sem proporcionar movimentos místicos de massas que viessam dar cabo destas terras honradas, enchendo-as de multidões alucinadas.
Miranda que vá ficando com as pequenas hordas de espanhóis que lá vão comprar toallas e muebles a bom preço. E ver o 2 da escarpa, já agora. É que este deve ser um caso único no Planeta: o fenómeno situa-se na margem espanhola do Douro mas, dada a sua localização, não há um único ponto do território espanhol de onde seja possível vê-lo. Quem o quiser fazer, tem que vir a Portugal. É deles, mas só nós é que aproveitamos. Bem feita.


Encantos inesperados

Não, esta deliciosa pracinha de toques barrocos não fica em Salzburgo ou noutro recanto qualquer da Europa Central. Fica em S. João da Pesqueira, margem sul do Douro vinhateiro.
Descobri-a no domingo passado, quando parei na cidade onde nunca tinha ido, ao princípio de uma tarde abrasadora, em busca de nada mais do que uma mesa e um copo de branco estupidamente gelado que me confortassem na jornada para outras paragens. Foi então que o Deus dos viandantes empurrou os meus passos para longe dos vulgares cafés de beira de estrada e me guiou pelas ruas laterais até esta (para mim) improvável jóia numa terra de nome improvável.
Não a conhecia, não sei ainda como se chama nem o que representa (vou documentar-me). Mas quero deixá-la já aqui, antes que se vá o encanto totalmente inesperado que senti ao desembocar nela.