segunda-feira, 12 de julho de 2010

Ita missa est



Aqui não se vê bem, mas o que este homem transporta aos ombros é uma bandeira espanhola. Eram umas duas da tarde de ontem. Ali onde Lisboa mergulha num Tejo cheio de nada, fazia horas para um momento de vida ou morte. Passeava pela Baixa, claramente suspenso, sem saber muito bem o que fazer do tempo que faltava.
Tive uma certa inveja dele, como neste momento tenho dos espanhóis. Foi bonita a festa, pá. Confesso que torci por eles - afinal de contas, se formos a ver, também estão em crise e têm complexos em relação à Europa: um jornal de Madrid celebrava o golo de Carles Puyol contra a Alemanha, em que o catalão voou sobre os centrais para atirar um míssil de cabeça, como uma vitória dos bajitos españoles sobre as torres germânicas. O grito que Andrés Iniesta arrancou ontem da garganta depois do pontapé que matou a Holanda na arena de Joanesburgo estava atravessado há muito, e não só por causa dos falhanços no futebol. Há na euforia espanhola um sentimento de desforra que nos diz muito a nós, portuguesitos, mas que estranhamos neles. Afinal, a Espanha é a Espanha. Toda a gente sabe onde é, e nem quase três séculos de decadência apagam o facto de já ter reinado sobre meio mundo, de Nápoles a Manila, de Bruges à Califórnia. Se eles soubessem o que é ser mesmo pequenino, percebiam a sorte que têm.

Mas torci por eles sobretudo porque jogam bem como o raio. Essa é que é essa. E pronto. Ita missa est. Agora só deverei voltar a interessar-me por coisas futebolísticas daqui a dois anos, quando for o Europeu - com um eventual assomo por alturas da final da Taça dos Campeões. Só me entusiasmam estas grandes celebrações, onde se jogam grandes coisas por grandes equipas. Até lá, tenho mais coisas que me ralem do que o Sporting-Paços de Ferreira.
Para a Holanda, país que nunca me entusiasmou por aí além, uma mão estendida. Ontem caíram que nem leões, e tinham tanta fome de ganhar aquilo como os espanhóis.
Não é coincidência que haja holandeses  neste vídeo, o primeiro que aqui ponho neste excelente belogue. Para mim é uma grande música, tocada e cantada de forma arrepiante. Já a ouvi vezes sem conta. Não conhecia estes Blöf.  Cristina Branco, lindíssima, é arrebatadora. O grunho que canta com ela é comovente. Os dois mostram como a  música e a emoção conseguem harmonizar duas línguas de trapos. Vejam como eles conversam e se entendem, sem perceberem uma palavra do que o outro diz.

15 comentários:

  1. Óptima fotografia, excelente vídeo, duplamente lastimável aposta futebolística (pela aposta propriamente dita e pelo seu sucesso)… Mas a boa notícia é, concordo, que ACABOU O MUNDIAL!

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  2. brilhante, mais uma vez, a crónica e o vídeo escolhido; tanta gente pr'aí a vender croniqueta em jornal e revista para deitar fora e v. a oferecer assim, de borla, estas pérolas; por minha parte, obrigado

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  3. só uma coisinha, tb ñ me interesso pelos passos do ferreira, agora qd se referir a paços de ferreira, aí, alto lá, respeitinho carago, e nada de colocar sporting e paços de ferreira na mesma frase! ai o...

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  4. O Abel tocou no que me tem espantado há muito, e preocupado a sério, tanta gente por aí a escrever com os pés, com ideias de merda, a imitar tudo o que já foi feito, sem poesia, sem originalidade e vendem apadrinhados por gente do mesmo tipo que ler-te é entrar noutra dimensão. É saborear uma iguaria. Obrigada.
    Teresinha

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  5. eu não elogio mais! ainda não pediu desculpa pelo apoucamento de paços de ferreira! mais a mais, anónimo teresinha, piropo de mulher põe o homem a nem sequer saber andar; por isso poupe no elogio se não o nosso cronista perde o jeito de escrever

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  6. Eu apouquei foi o Sporting, Abel. Desculpe lá...
    Mas a sério, não tenho nada contra a capital do móvel, foi só o primeiro que me veio à cabeça.
    E obrigado, Teresinha. Não ligues ao Abel. Eu não me importo que falem de mim, nem que seja bem.

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  7. Esta comiseração dos protugueses em se sentirem pequeninos e basearem-se nessa desculpa para não fazerem nada,sempre me arrepiou e destesto. Falas dos Paises baixos(Holanda),um país 3 vezes mais pequeno que Portugal e quase deste que se formou tem sido normalmente um país evoluído e economicamente forte.
    Onde é que a pequenez entra aqui? não será o comudismo tuga?
    Por acaso não fomos já um povo grande ,sem medos, aventureiros e com um grande império?
    Fazes bem em ouvir sem conta essa sintonia musical de dois países na voz dos seus interpretes.
    Para que conste os holandeses gostam muito do fado e de artistas portugueses....pk será?

    MJM

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  8. Que comiseração, MJM? Isso vem a propósito de quê? De eu dizer que somos pequeninos? E não somos? Isso não é comiseração, é a simples e fria referência a um facto.
    Quanto à pergunta final: Se calhar é porque o fado e os artistas portugueses são bons, sei lá. Mas isso prova o quê?

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  9. Sei que te referiste friamente a esse facto,facto esse que,genéricamente engloba em si essa comiseração.Nós somos pequenos não podemos fazer mais,coitadinhos de nós.
    A pequenez não serve de desculpa para não tornármos este país num país melhor, em vez de nos andarmos sempre a queixar e querermos que façam tudo por nós.
    Pergunta ao Mourinho se se sente pequeno.Terá ele medo da grandeza dos outros países?
    Somos pequenos em trabalhar ,mas grandes na ostentação.
    JPM espero que escreveres sobre este facto,abanes consciências e mentalidades,dando assim o teu pequeno contributo para tornar mais pequena a pequenez.
    Provar algo? longe de mim..limitei-me a dizer que o fado e os nosso artistas são apreciados na Holanda, Também o são no Japão e menos ou quase nada em Inglaterra e Alemanha .

    MJM

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  10. MJM:

    Nós somos pequeninos. É um facto. Referir isto não implica necessariamente comiseração. O que eu quis referir no texto que escrevi foi apenas a estranheza por os espanhóis - um país maior que o nosso, com uma história "maior" (não necessariamente "melhor"), que já dominou o mundo muito mais do que nós, que tem nesse mundo, actualmente, uma imagem bastante mais forte do que a nossa (muito mais gente conhece a Espanha do que conhece Portugal) se sentirem ,mesmo assim, complexados. E se eles se sentem assim, mais razão teríamos nós para sentir.
    É apenas isto que lá está, MJM. Não está nenhuma comiseração. Está apenas a consciência do que somos. E somos o que somos: nem tão pequenos quanto por vezes achamos ser, nem tão grandes quanto por vezes gostaríamos de parecer.
    Quanto à pergunta sobre os gostos dos holandeses, achei que querias tirar alguma conclusão disso, relacionada com esta questão.

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  11. Ainda a propósito de imagens nacionais, uma história que eu já contei várias vezes: há anos, em Austin, Texas, uma senhora perguntou-me de onde eu era. "Portugal", respondi. Ela fez um ar de quem procura situar qualquer coisa: "Portugal? É um país comunista, não é?"
    Tenho a certeza de que ninguém no mundo (nem no Texas!...) faria este ar e diria isto em relação à Espanha. Quanto mais não seja por causa dos toureiros e do flamenco, não deve haver gente no chamado mundo civilizado que não a conheça.

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  12. acontece, escreve-se uma coisa, mas há quem leia o que lá não está; sobre a senhora texana, se fosse eu a si não teria tanto a certeza, de espanha já ouviu falar mas onde fica, sei não...; um cliente sueco que estudou na califórnia dizia aos amigos que era de stockholhm cuja capital era sweden, e as reacções eram geralmente fica na "europe right?"; vá lá, vá lá; aquilo é muito grande e texano que saiba onde fica o wisconsin é geógrafo

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  13. Eu referi-me a conhecer Espanha, nem que seja de nome. Isso de onde fica é outra coisa. 70% dos alunos de liceu dos EUA não sabe apontar o próprio país no mapa, e a maioria acha que a América Central é o Kansas.

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