sábado, 28 de agosto de 2010

Novela dos simples*

Ver actores nas novelas portuguesas a pretender representar personagens "populares", "rudes" e "puras" é um espectáculo deprimente que diz tudo sobre o modo como as "elites" (com muitas aspas) vêem o país, e nada sobre o país.
Na interpretação desses actores, geralmente saídos de passereles de moda ou de tascas do Bairro Alto, e que só se aventuraram para fora da cidade besuntados de creme solar de écrã total, interpretar um simples pescador de Setúbal,  ou um moço de estrebaria do Ribatejo, significa fazer caretas, falar e gesticular como um atrasado mental arraçado de babuíno, e ter  a clarividência de um malmequer. Para não falar de uma rapariga meio selvagem que habita uma novela actual e que é, como persona, tão convincente como o primeiro-ministro a dizer que não há crise. A pequena mais parece uma menina parva de Massamá com birra por lhe terem tirado o IPod do que a "força da natureza" que supostamente representa.
A culpa não é só deles e do seu talento dramático equivalente ao de abóboras, mas sobretudo das respectivas direcções de actores, fazendo a fineza de acreditar que existem. E de quem lhes escreve as falas, já agora. Estas interpretações são de quem não faz a mínima ideia do que é ser simples, puro, ou simplesmente humano. Confundem candura com imbecilidade. Macaqueiam modos que não sabem representar, traduzindo-os num espectáculo grotesco. E são praticamente um insulto ao tipo de pessoas que pretendem encarnar. Se eu fosse pescador  ou moço de estrebaria, fazia-lhes uma espera.
E não me macem com comentários género "é bem feito, quem te manda ver novelas," e ditos correlativos. São outras tantas baboseiras. Toda a gente vê novelas, nem que seja uma vez na vida. E bastaria essa vez para perceber isto.

*Este foi posto ali noutra tasca, mas depois apeteceu-me pô-lo também  nesta.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

O som do silêncio

Costa do Estoril, quarta ao fim do dia. O pontinho branco no céu não é defeito, é mesmo a "Estrela da Tarde"

Eu queria uma mesa com vista para o prato mas, desta vez sem exemplo, não fazia muita questão do que estivesse nele, desde que também houvesse vista para o mar glorioso que estava no crepúsculo desta noite. Era um mar muito azul, que ia bater no laranja do céu. 
Estava uma dessas atmosferas raras no Verão, límpida como a alma de um santo. Podiam contar-se as luzinhas na Costa de Caparica e ao longo do arco que vai até ao Espichel. Mesmo que o crepúsculo não fosse eterno, como apetecia, eu não podia ir já para casa. Tinha que ficar ali uns tempos a ver e a sentir tudo aquilo, e a noite quente. E tinha uma fome de forçado das galés. 
Precisava de uma esplanada frente ao mar, em resumo. Fui em demanda. Muitas estavam cheias, outras nem tanto. Mas em todas - todas, sem tirar uma - havia música a berrar.
É sempre assim. Nunca consigo encontrar a porcaria de uma esplanada silenciosa, onde se possa estar sossegado. Tem sempre que ter música a tocar - e geralmente, daquela que faz imenso barulho. Sítios lindos, onde se podia estar a ler, ou a ouvir o mar, ou os passarinhos, ou o silêncio, e tungas, põe funky nisso, porque a malta adora. Pumps, pumps, pumps, oh yeah.
As pessoas têm medo do silêncio. Deve ser porque o silêncio as confronta consigo próprias, e depois não gostam do que vêem. Têm que ter sempre uma musiquinha em fundo, porque sem isso o mundo delas fica descarnado, vazio, sem sentido. Sem banda sonora, a vida das pessoas fica demasiado real.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Intermezzo

Eu detesto ver animais sofrer. Não suporto nem imaginar que se possa provocar sofrimento seja a que criatura viva for só para deleite do homem. Por isso vou lançar uma petição para acabar com a cozedura de lagostas vivas. Na Catalunha não se lembraram disto, e por isso cá em Portugal também não.